Homem Barroco

  • on 13/12/2007
  • Ou Dualismo Existencial



    Não sei se os leitores já perceberam, mas sabe sou um homem barroco, no sentido de quê o homem barroco, pelas circunstâncias em que vive, tem uma vida tensa, tornando-se um ser dividido e angustiado.

    Essa sensação sufocante provém das pressões antagónicas a que é submetido, na literatura clássica: de um lado, encurralado pela Contra-Reforma; do outro, querendo preservara perspectiva libertária que lhe fora revelada pelo Renascimento. No meu caso o antagonismo se dá pela minha moral e ética, essencialmente cristã, e diria mesmo puritana, e o que desafia todos os homens, minhas inúmeras fraquezas, que são testadas diariamente.

    O homem barroco uma fez acuado, o que faz para sair desse impasse? Assumi diante da vida atitudes duplas e contraditórias! Procura conciliar o antropocentrismo renascentista com o teocentrismo medieval/contra-reformista ou mas especificamente, ora rompe com o ditames morais, ora busca neles alívio e paz.

    A essa busca de síntese existencial corresponde o fusionismo ou hibridismo, traço fundamental da arte barroca, e de certa forma fator constitutivo do meu comportamento social. Tornando-me assim um ser “anfíbio”!

    E mais uma vez a contradição se estabelece ora procurando desfrutar os prazeres materiais da efêmera vida terrena (temática do carpe diem horaciano, “aproveita intensamente o dia”), ao mesmo tempo em que se reaproximou da Igreja, ou da minha consciência, para assegurar a felicidade eterna, ou a paz interior que advém de estar em acordo entre atos e pensamentos.

    Para alcançá-la, sente necessidade de dialogar com Deus (consciência), pois “o santo só pode surgir através do homem”, como considerava Pe. Antônio Vieira, o escritor mais representativo do Barroco na língua portuguesa.

    Esse dilema, essa permanente sensação de dúvida, insegurança e hesitação vem demonstrada, por exemplo, do soneto seguinte:



    “Delírios da Natureza”

    Em um ponto muito me alegro, e me entristeço,
    Choro,e rio, ouso, e temo, vivo, e morro,
    Caio, e grito, contemplo, e não discorro,
    Parto, e fico, não vou e me dispeço.

    Lembrando-me de mim, de mim me esqueço
    Ora fujo, ora torno, paro e corro,
    Já atado, já solto, preso, e forro,
    Lince, e cego,me ignoro, e me conheço.

    Eu mesmo me acredito, e me desminto
    Eu mesmo agravo o mal, e peço a cura
    Eu mesmo me consolo e me ressinto.

    Saiba, pois, toda a humana criatura,
    Que, para escapar deste labirinto,
    Há de fugir às mãos da formosura.

    (Francisco de Pina e Melo, Rimas, 1a parte, 1725)

    Ser um homem barroco em tempo tão sombrios onde o conceito de moral é considerado ultrapassado e o padrão ético é similar ao de sodoma parece um tanto quanto fora do contexto (parafraseando uma amiga), mas para bem ou para mal, sou assim. Barroco.
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    7 Recados:

    Thalita disse...

    . dualismo
    . carpe diem
    . contradição
    . fusionismo

    linguagem complexa. uso de hiperbato, antítese e paradoxo. linguagem ornada

    Louise Romano disse...

    E que mal há nisso...acho que nenhum!!!! O humano de modo geral é capaz de tudo a qualquer hora, ninguém é totalmente bom e ninguém é totalmente ruim. Então apenas seja, se isto te faz bem te faz feliz apenas Seja assim...um Homem Barroco.

    Louise Romano disse...
    Este comentário foi removido pelo autor.
    Louise Romano disse...

    ...mais um(eu não resisti)

    Acho que vou que toda vez que vier aqui vou ter que ficar com dicionário do lado!!!hehehe!!!A cada postagem o nível intelectual é melhor.

    bjs a ateh!!!

    Rachell Ramalho disse...

    Completamente humano...
    A dualidade é fato. Alguém que se engane ou tente se esconder atrás de apenas uma face somente acaba negando a multialidade do próprio ser. Se permitir a ter dúvidas ou ser dúvidas é um jeito sincero de admitir o quão complexo é um indivíduo. Todos somos barrocos no fundo do peito, só nos falta grandiosidade e generosidade ver que essa é a beleza de nossa espécie... é a dúvida e a busca de uma solução é o que nos caracteriza como seres pensantes...
    Parabéns pelo belíssimo texto...
    Com carinho, desculpe o singelo recado de uma atriz de frases rasas.

    Paula Guerra disse...

    Com toda a certeza, somos todos divididos, não é verdade?
    Ou, ao menos, as criaturas pensantes normalmente assim são.
    Dividir é uma palavra estranha e dolorida. Primeiro que dividir me lembra separar.
    Depois que nada deveria se dividir, porque nunca se consegue com perfeição.
    Daí ficamos duvidosos. Sobre de que lado somos.?

    (Bom, tento ter um ponto de vista. Mas não tenho. Sempre me enrolo e fujo nas entrelinhas. Vai ver por isso que eu não me dou bem em redação!)

    Thalita disse...

    nem um post'zinho' de despedida de 2007 ?

    usando palavras de um amigo
    ' não se abandona um blog assim '