Ás vezes o inesperado acontece...
Ás vezes temos de nos despedir de alguém muito importante...
E não é apenas uma dor o que sentimos: É um vazio que corta, fere, pungencia, e não cicatriza.
São as eternas víceras de prometeu devoradas durante os séculos por abutres.
São os estigmas cristães perpetuados nas carnes de seus seguidores.
E aos mesmo se fundem as dúvidas do príncipe Hamlet e as incertezas do homem barroco.
A métrica parnasiana e a forma modernista, o indianismo e o condoreirismo românticos se equiparando nos confusos sentimentos humanos!
É poesia de Gonçalves Dias em misto a Byroniana...
É o mundo perdendo a vida que nele nasce e se encerra, que agora não tinhas cores, nem texturas, nem perfumes...
E, assim, sentir uma flor brotar no sangue, na alma: a rosa de Hiroshima desabrochar em seu peito em tons cinza num quadro de Monet.
O vôo de Pícaro,
O inferno de Ades,
As dúvidas Shakespeareanas.
E na confusão doce e áspera, em tom uníssono, surge a lágrima implícita da sede eterna em um único espasmo finito...
E então, enfim, a voz nínfica canta:
Durma bem, querido, durma bem
Feche os olhos: o dia se põe...
As estrelas surgem altas no céu
Por favor, querido, durma bem
Esqueça o dia
Esqueça o passado
Descanse...
Apenas encerre as pálpebras
E descance:
Lembre dos dias quentes, árvores e flores
Pense nas borboletas estúpidas
Sonhe com os rios,
com futuros amores!
E, enfim, durma bem...
Sinta minha mão no seu rosto
Escute minha voz nos seus ouvidos
Ouça as palavras ditas em sussurro:
-Durma bem querido, durma bem
Quando estiver com medo,
E apertaste com cálidas mãos o cobertor
Quando a noite te assustar com sombras móveis
Me chame, meu amor...
E eu vos direi: -Durma bem...
Se estiver sozinho
E as horas tornarem-se logas
Se o peito doer
A voz sumir
Lembre-se de mim
E durma bem, apenas durma bem
Um menino, no seu quarto de dormir
Um menino, um menino
Assustado, sozinho e quieto
Apenas um menino...
Não pude te dizer adeus
Sua mãe não se despediu
Me desculpe
A poesia antes do tempo fugiu:
Fébres, cóleras e gemidos...
Me perdoe,
Não disse adeus
Me perdoe: o relógio urgiu...
Quando estiver sozinho a noite
E sua mãe não puder lhe acalentar...
As mão frias no túmulo os carinhos pedidos
Nos olhos espalmados irão refletir:
Lágrimas tristes,
Do coração de quem teve que partir...
O único sussurro que de lembrança posso deixar
E o único espasmo de consolação pra te dar
É um sussurro, apenas frases e palavras:
-Durma bem meu querido, durma bem...
Rachell Ramalho
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