O Crime do Padre Amaro de Eça de Queiroz

  • on 25/04/2010
  • José Maria de Eça de Queiroz(1845-1900) foi um escritor, diplomata e jornalista português. Crítico ferrenho da pequena burguesia e do clero de sua época, ele se consolidou como nome maior do realismo lusitano, sendo O Crime do Padre Amaro a obra mais vinculada a esse movimento em Portugal. Suas obras não mostram apenas a modernização da literatura do país, em oposição ao grupo romântico conservador, como também ilustra a penetração gradual da modernidade social, política e científica no país com a expansão das reivindicações sociais e do socialismo que começava a ganhar vulto como corrente política.



    Primeiro romance do autor e do realismo português, O Crime do Padre Amaro acompanha a trajetória de Amaro Vieira, pároco de Leiria(cidade portuguesa). Há um momento de contato inicial com a pequena burguesia da cidade representada pelas beatas, pelo boticário e pelos outros religiosos da cidade. A história realmente começa quando ele conhece Amélia, filha de Augusta Caminha(aludida no romance quase sempre por S. Joaneira) uma das beatas, e se apaixona por ela. Então, começa um relacionamento proibido com a ingênua jovem, que se despedaça aos poucos no romance.
    Além de seu papel aparente como crítica feroz aos corruptos eclesiásticos do interior de Portugal, que tinham pensamento e pregação ainda interiores à Contra-Reforma como venda de indulgências e de material sacro, ele mostra como a educação religiosa e conservadora ministrada aos jovens, às vezes por esses mesmos religiosos, eram danosos a eles, só ver as deturpações de conduta e moral dos padres e das beatas(Amélia inclusive), e também ilustra o conflito entre as novas ideologias representadas por João Eduardo, ex-noivo de Amélia e jovem com tendências liberais, pelo abade Ferrão, que mostrava a própria religião sem as máculas do clero corrupto, e pelo doutor Goveia, representando o naturalismo(corrente de pensamento que se desenvolvia em paralelo com o realismo e que, influenciado pelo chamado darwinismo social, colocava o homem como prioritariamente um animal, sendo suas ações causadas por nossas necessidades básicas como reprodução e alimentação).
    Trecho do livro:
    "Nunca ninguém consultara as suas tendências ou sua vocação. Impunham-lhe uma sobrepeliz; a sua natureza passiva, facilmente dominável, aceitava-a, como aceitaria uma farda. De resto não lhe desagradava ser padre. Desde que saíra  das raízes perpétuas de Carcavelos conservara o seu medo de inferno, mas perdera o fervor dos santos; lembravam-lhe porém os padres que vira em casa da senhora marquesa, pessoas brancas e bem tratadas que comiam ao lado das fidalgas e tomavam rapé em caixas de ouro; e convinha-lhe aquela profissão em que se fala baixo com as mulheres- vivendo entre elas, cochichando, sentindo-lhes o calor penetrante- e se recebem presentes em bandejas de prata. Recordava o padre Liset com um anel de rubi no dedo mínimo; monsenhor Sávedra com os seus belos óculos de ouro, bebendo aos goles o seu copo de Madeira. As filas senhora marquesa bordavam-lhes chinelas Um dia tinha visto um bispo que fora padre na Bahia, viajara, estivera em Roma, era muito jovial; e na sala, com as suas mãos ungidas que cheiravam a água-de-colônia apoiadas ao castão de ouro da bengala, todo rodeado de senhoras em êxtase e cheias dum riso beato, cantava, para as entreter, com a sua bela voz
                                         Mulatinha da Bahia,
                                          Nascida no Capujá..."
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